Ponto final para Demóstenes
Já seria algo a manchar a ficha do senador. Mas o que seria divulgado depois pulverizaria de vez a folha corrida de Demóstenes, a ponto de José Agripino Maia, novo líder do DEM no Senado, posto a que teve de renunciar, deu ao colega goiano o prazo deste fim de semana para ele preparar a defesa, a ser feita o mais cedo possível no plenário do Senado. Não será tarefa fácil. Os desdobramentos do escândalo fazem o senador descer a ladeira rumo ao descrédito absoluto. E a cada revelação de conversas mantidas entre ele e o bicheiro, retirada das mais de 300 gravações feitas pela Polícia Federal, fica indesmentível que o relacionamento entre os dois ultrapassou de léguas o simples campo da simpatia pessoal — o que já seria inadmissível, repita-se. O senador agia em Brasília, e não apenas no Congresso, como representante do bicheiro.
Inexiste registro de caso ocorrido nos porões do poder de tão deslavado lobby a soldo de negócios escusos. E envolvendo alguém do alto escalão na hierarquia de um dos poderes da República. Diálogos mantidos entre “doutor”, Demóstenes, e “professor”, Cachoeira, revelados ontem pelo GLOBO, dão a medida da profundidade do relacionamento, digamos, profissional entre eles.
Em abril e maio de 2009 a dupla tratou de assuntos-chave para os “negócios” do bicheiros. Num deles, fica evidente que o senador trabalha para Cachoeira junto ao Tribunal de Justiça de Goiás e faz contato com o desembargador Alan Sebastião de Sena, devido a um processo contra policiais de interesse de Carlinhos. Sena, ao se defender, alertou que contrariara o bicheiro ao manter a condenação dos réus.
O senador também fez lobby ao rastrear um projeto de lei na Câmara contrário ao interesse do amigo. Em três conversas sobre o projeto, Demóstenes alerta a Cachoeira que o conteúdo da lei o prejudica. O bicheiro estava otimista, pois o projeto regulamentaria jogos nos estados — a contravenção tem há tempos este objetivo —, mas o prestativo senador lhe chama a atenção para a criminalização da jogatina fora da lei. Entende-se que o projeto acaba com o tratamento do bicho como contravenção e o enquadra como crime.
Até a demissão de funcionários fantasmas no gabinete de Demóstenes — devido a uma “caça às bruxas” — é assunto entre Demóstenes e Carlinhos Cachoeira. O DEM tem razão ao querer explicações, rapidamente, do senador. Assim como se entende por que Cachoeira foi generoso ao presentear Demóstenes e este pediu ao parceiro o pagamento de pelo menos uma viagem de táxi-aéreo.
Os advogados do senador têm esperança em desqualificar as gravações como provas judiciais. Pois, alegam, o parlamentar foi apanhado em grampos feitos para Cachoeira. Investigar um senador só com a liberação do Supremo. É possível. Mas a carreira política de Demóstenes recebeu um ponto final.
Fonte: O GLOBO